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terça-feira, 29 de outubro de 2024

Diálogo interceptado pela PF indica que Amamsul atua para engavetar denúncias contra juízes

Amamsu, que funciona em Campo Grande. (foto: Correio do Estado).


Além de atuar como um clube exclusivo, centro de formação e “sindicato” para a defesa dos interesses de juízes e desembargadores, a Amamsul (Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul) pode também estar sendo usada para impedir o avanço de investigações contra seus membros quando chegam ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Essa possibilidade foi levantada em um diálogo interceptado pela Polícia Federal, que culminou, na última quinta-feira (24), no afastamento de cinco desembargadores e um juiz, além de atingir dois desembargadores recentemente aposentados. 

Em uma conversa entre a juíza Kelly Gaspar Duarte Neves, de Aquidauana, e a servidora Natacha Neves de Jonas Bastos, ex-assessora do desembargador Júlio Roberto Siqueira no Tribunal de Justiça, surgiu a suspeita de que a Amamsul atua para “engavetar” denúncias. No diálogo divulgado pelo Superior Tribunal de Justiça, a magistrada comenta: “Do SIDENI também tem... só que sempre pelos filhos, sabe? Mas a investigação lá tá há um tempão já no... no CNJ. A gente sabe porque eu fui da... da AMAMSUL, então a gente meio que é que segura, sabe?”.

A conversa foi interceptada em fevereiro deste ano, logo após o afastamento do desembargador Divoncir Maran, novamente investigado em operação relacionada à venda de sentenças. Maran, afastado desde 8 de fevereiro, é acusado de receber propina para libertar o megatraficante Gerson Palermo, piloto de avião condenado a 126 anos por tráfico de cocaína e outros crimes. Embora fosse um traficante conhecido, Palermo foi liberado em 2020 com tornozeleira eletrônica, aproveitando um feriado de Tiradentes. A decisão foi revista no dia seguinte, mas Palermo já havia desaparecido e nunca mais foi localizado.

A denúncia sobre a venda de sentenças que favoreceu Palermo foi apresentada ao CNJ pelo juiz Rodrigo Pedrini Marcos, de Três Lagoas, há mais de três anos, mas ficou “engavetada”. Somente em setembro de 2023 o CNJ abriu investigação contra Divoncir. Apesar de afastado, ele prestou depoimento apenas em 3 de abril de 2024, três dias antes de completar 75 anos e se aposentar, o que sugere que a denúncia ficou “engavetada” até caducar.

A juíza de Aquidauana, ex-Diretora de Interior da Amamsul, lançou luz sobre os bastidores da associação ao afirmar: “eu fui da... da AMAMSUL, então a gente meio que é que segura, sabe?”, referindo-se a denúncias que envolviam o desembargador Sideni Soncini Pimentel, afastado recentemente.

No diálogo, a servidora Natacha questionava a juíza Kelly sobre a inatividade do CNJ em relação a denúncias, incluindo contra Sideni e outros nomes. Na operação de quinta-feira, Natacha e o desembargador Marcos Brito (Marcão) foram alvos, com Marcão entre os cinco desembargadores afastados pelo STJ.

Em setembro do ano passado, o CNJ decidiu abrir investigação contra Divoncir Maran, e o advogado do desembargador enfatizou que a investigação se deve à "insistência" do juiz Rodrigo Pedrini Marcos, que teria denunciado a suposta impunidade promovida pela Amamsul.

Esse mesmo juiz já havia denunciado a desembargadora Tânia Garcia Borges, posteriormente demitida pelo CNJ por influenciar a libertação de seu filho, preso por tráfico. A atuação da Amamsul em favor de magistrados é evidenciada pelo fato de que, até hoje, apenas um magistrado foi demitido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, além de Tânia Borges e Aldo Ferreira da Silva Júnior, demitido pelo TJ e ainda em busca de reintegração.

A investigação em curso trouxe à tona dezenas de páginas revelando que Aldo, sua esposa e os filhos dos desembargadores afastados repartiram cerca de R$ 5,3 milhões, provenientes de um aposentado do Rio de Janeiro em 2018.

Em resposta, a Amamsul declarou que não possui poderes para obstruir procedimentos no CNJ ou em qualquer esfera do Judiciário, e que o diálogo transcrito não comprova ligação indevida entre a associação e os envolvidos. A entidade afirmou que atua exclusivamente dentro de suas funções institucionais, promovendo a defesa legítima dos interesses de seus associados, conforme a legislação e regras processuais vigentes.

Fonte: Correio do Estado (leia aqui)

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