Sem entrar no mérito da questão da imposição de "toque de recolher" aos menores pelo Poder Judiciário em algumas cidades do interior de Minas, eu preciso, antes, saber em quem confiar.
É que, enquanto o Correio de Araguari informa que, em Patos de Minas, "as ocorrências envolvendo menores foram reduzidas em 95% em apenas um mês de vigência da determinação do Juizado de Menores", o UOL nos esclarece que, mesmo com essa restrição, as "ocorrências policiais envolvendo menores aumentam 44%" naquela cidade.
Quem quiser conferir e tirar suas próprias conclusões sobre a eficácia da medida restritiva, basta acessar:
http://www.correiodearaguari.com/correio/index.php?option=com_content&task=view&id=1140&Itemid=32 ehttp://noticias.uol.com.br/cotidiano/2009/07/22/ult5772u4721.jhtm
4 comentários:
Independente da possível veracidade deste ou daquele órgão de informação, minha conclusão é que as ocorrências diminuíram, ou seja, deixaram de figurar em boletins, pois elas foram levadas pra dentro de casa, onde, entre quatro paredes, fervilha um caldeirão de problemas que acabam escoando para o seio de toda a sociedade.
As primeiras cidades que adotaram o toque de recolher no estado de São Paulo (Fernandópolis, Mirassol, Ilha Solteira e Itapura, Meridiano, Macedônia e Pedranópolis) estão na fronteira com Mato Grosso do Sul e é rota de tráfico de drogas. Dizem que por lá o envolvimento de menores com o crime caiu 55% depois do toque de recolher. O Ministério Público garante que a decisão se baseia totalmente no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A discussão deverá chegar aos tribunais superiores, principalmente depois do Fantástico ter alardeado o crescimento de municípios que adotaram a medida. Bem disse o Senhor Denilson Cardoso de Araújo (serventuário de Justiça do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro): “É necessário garantir o direito de ir e vir do adolescente. Mas é necessário lhe dar rumos e destinos, para que não fique à deriva. Deriva social é o naufrágio do futuro. O menor de 18 anos deve ir do bom para o melhor. Do bem para a virtude. Da família sã para a cidadania responsável. E isso é um aprendizado que envolve disciplina, horários de sair e chegar, itinerários permitidos e itinerários vedados. Envolve genitores comprometidos com a construção, em seus filhos, de homens e mulheres de bem. E, quando necessário, envolve o Juiz da Infância e da Juventude, que "não é pai de todos, mas não deve ser padrasto, nem cego".
PEÇO LICENÇA AO BLOGUEIRO MARCOS PARA TRANSCREVER, a título de utilidade pública,
AS SEGUINTES CONCLUSÕES DO
DR. Roberto da Silva, Membro da Subcomissão de Defesa dos Direitos da Criança e do
Adolescente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP
“O ECA (Estatudo da Criança e do Adolescente) inaugurou uma nova ordem jurídica e institucional para o trato das questões da criança e do adolescente, estabelecendo limites à ação do Estado, do Juiz, da Polícia, das Empresas, dos adultos e mesmo dos pais, mas não foi capaz ainda de alterar significativamente a realidade da criança e do adolescente. A mudança de nomenclatura, substituindo os rótulos pejorativos de "menor", "infrator", "abandonado" e etc., estabeleceu a cultura do "politicamente correto", mas quem estava nas ruas ou nas instituições antes do ECA, hoje, se adulto, está no Sistema Penitenciário ou continua sendo portador das marcas e dos estigmas incorporados durante a infância.
Parcela significativa da sociedade brasileira cultiva o sentimento de que o ECA, ao estabelecer limites ao exercício da autoridade familiar, jurídica, institucional e policial sobre a criança e o adolescente, reforçou também a impunidade aos delitos cometidos por eles.
Neste sentido, as distorções mais visíveis na interpretação e aplicação do ECA é o uso que adultos, quadrilhas criminosas e o tráfico organizado passaram a fazer da criança e do adolescente, iniciando-os precocemente nas lides delinqüenciais. Crianças e adolescentes são recrutados por adultos e por quadrilhas para fazerem os seus trabalhos sujos, tipo ser o portador da droga e das armas ou exercer a vigilância armada nos locais de tráfico. O resultado desta distorção foi o recrudescimento do extermínio de crianças e de adolescentes por parte da polícia e dos grupos de justiceiros, geralmente composto por policiais pagos por comerciantes das periferias das grandes cidades e os clamores da sociedade no sentido de redução da maioridade penal para os 16 anos.
O Código Civil Brasileiro define a maioridade civil aos 18 anos e a maioridade jurídica aos 21. A maioridade eleitoral é estabelecida, opcionalmente, aos 16 anos, a maioridade trabalhista aos 14 anos e o Código Penal Brasileiro estipula a maioridade penal também aos 18 anos. Crianças menores de 12 anos autoras de ato infracional, de qualquer tipo, o ECA manda o Conselho Tutelar aplicar medidas de proteção e medidas sócio-educativas e aos maiores de 14 até 18 anos, o juiz pode aplicar medidas de internação pelo período máximo de três anos, liberdade assistida e semiliberdade. Os mesmos crimes, se praticados por adolescentes ou por adultos, podem receber penas de 3 ou 30 anos, e é neste sentido que se dá a distorção quanto à utilização de adolescentes por parte de adultos, de quadrilhas e de gangues. “
O enriquecimento da discussão proporcionado pela manifestação do Aristeu e do Natal é indiscutível.
Esse assunto é tormentoso e mexe em pontos fundamentais: a liberdade de ir e vir e a proteção à criança e ao adolescente.
A solução está em colocar na balança esses pontos. Para proteger as crianças e adolescentes é necessário impor-lhes restrições ao direito de ir e vir?
Se partíssemos apenas da realidade normativa, a medida não seria necessária, na medida em que a Constituição, normas internacionais e o Estatuto da Criança e do Adolescente são, formalmente, capazes de proteger.
Na prática, contudo, a situação é bem diversa. Pior: há uma clara sensação de impunidade aos menores infratores.
Na verdade, esse quadro deriva não somente do fracasso das normas penais, mas também e, principalmente, da ruína em que se encontram outras instituições que deveriam funcionar como instâncias de controle, a exemplo da família, da escola, da igreja. Não funcionando essas barreiras de contenção, debita-se toda culpa ao azarado Código Penal, que é injustamente, no ponto, tachado de ultrapassado.
O problema, em suma, está no fato de os brasileiros não darem a devida atenção às crianças e adolescentes. Assim, as falhas na criação e educação dos filhos ultrapassa os muros residenciais e atinge a sociedade como um todo. Falhando, também, os mecanismos estatais de controle, o quadro tende a se agravar, como estamos presenciando.
Por essas razões, a priori e sem maior aprofundamento no exame, sou favorável à imposição de condicionantes ao direito de ir e vir de crianças e adolescentes. Um detalhe: se o Estado impuser medidas sem fiscalizar-lhes o cumprimento, tudo permanecerá como dantes....
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