quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Água parada e inércia

“A grama do vizinho é sempre mais verde.” O ditado popular serve bem a uma análise da condição política de nossa vizinha de lá do rio, em relação à administração e à funcionalidade dos serviços públicos. Sabe-se que as deficiências do atendimento ao público é lugar comum no país, principalmente, falando em Saúde Pública. Porém, alguns administradores, possuidores de visão, conseguem, ao menos, amenizar a situação.


A questão do combate à dengue é um exemplo que vou aqui tratar, pois é a área que conheço há 15 anos nos serviços de campanha. Percebemos que nossa vizinha Uberlândia consegue alavancar soluções com maior rapidez e eficiência, mesmo possuindo área urbana maior que nossa Araguari, o que em tese, tornaria mais difícil o controle vetorial. Apesar dos problemas com mão-de-obra, capacitação e insumos, a secretaria de saúde aproveita há vários anos a mesma equipe de coordenação e supervisão.

Os gestores de nossa vizinha perceberam que rifar os cargos técnicos é extremamente prejudicial ao PNCD ( Programa Nacional de Controle do Dengue). A troca de coordenação de 4 em 4 anos causa descontinuidade ao serviço e, na maioria das vezes, aquele que adentra a chefia do trabalho é total desconhecedor da técnica, e muitos nem querem se inteirar do serviço. Geralmente, devido a uma mentalidade elitista e retrógrada, não consideram o conhecimento prático do servidor, analisando o trabalhador com uma dicotomia: SUBALTERNO/INCAPAZ. Usam a hierarquia não para o sistema funcionar, mas apenas prejudicar o servidor.

O corre em Araguari uma desestruturação do trabalho logo depois das eleições municipais. Inclusive a orientação dos auditores do Ministério da Saúde é que se fixe uma equipe de coordenação. Deste modo a continuidade do trabalho seguiria normalmente, sem preocupação com a rifa de cargos e garantindo, com a experiência adquirida, a qualidade da execução do PNCD. Deve-se evitar, inclusive, a alta rotatividade que o contrato temporário causa, no caso do servidor de campo. Uma das premissas do PNCD é que o agente se familiarize com os moradores de seu setor. Isso só é possível com concurso público. Contratação é precariedade administrativa.

No ano de 2009, participamos de uma capacitação em Patrocínio, onde estavam presentes os colegas de Uberlândia. Em conversas extremamente produtivas, percebemos que lá a coordenação tem acesso pleno ao secretário de saúde, que apoia e confere condições de trabalho (não de circo) à equipe. Araguari, exceção à época do companheiro Edilvo, o gestor raramente abre as portas para se inteirar dos problemas. Coordenadores e supervisores são barrados, cerceados e amputados ao apresentarem iniciativas. Não se dá “carta branca” para a execução de projetos. Não realizam projetos, mesmo quando nós, agentes de endemias, entregamos tudo pronto e “mastigado,” bastando apenas pôr em prática. Tenho protocolo desses projetos. Nossos administradores ainda não perceberam que, apesar da técnica do PNCD ser exigência nacional, o município tem plena autonomia para elaborar projetos complementares ao Programa. Um dos problemas do PNCD é que ele é imposto de cima para baixo, desconsiderando as micro-regionalidades e condições sócio-culturais de cada localidade. Explico: a técnica nivela todos os moradores, desconsiderando problemas específicos de cada bairro. Simples concluir, que em termos de campanha, não devo tratar o morador do Vieno igualmente ao morador do centro e vice-versa.

Cada bairro tem sua dinâmica e cada morador tem sua maneira de entender a realidade. Em cada bairro predominam tipos diferentes de criadouros. Deve-se pensar uma política que insira, no morador, a consciência de que ele faz parte dessa dinâmica. Ensinar que ele deve cuidar apenas de seu quintal, reduz a capacidade do morador sentir-se como parte de um todo. Deve-se torná-lo sujeito ativo dentro da comunidade. E dar condições dele sentir-se assim. Enfiar goela abaixo ensinamentos de cima para baixo nunca funcionou. Qualquer ser humano despreza o que lhe é imposto.

Nossos gestores e até alguns colegas vêem no mutirão uma solução ao problema. Ocorre que, graças ao apego a medidas paliativas, mutirão aqui no município é sinônimo de “catar lixo” do morador. Parecem não conseguir entender a abrangência do termo. Vinculou-se mutirão a enormes contingentes de servidores na rua, recolhendo lixo dos moradores e depositando-o em cima de caminhões caçamba. O resultado efetivo do mutirão é um paternalismo que leva à inércia do morador em relação à dengue.

Mutirão deve, inclusive, ter apoio de todas as secretarias. Aliás, o trabalho em si deveria ser cotidianamente acompanhado pelos gestores de outras pastas, o que não ocorre no Brejo Alegre. Mutirão deve ser tomado como medida educativa e não apenas trabalho de remoção. Porém, não pensam educação como forma eficaz de combate.

Falou-se em mutirão nos distritos de Amanhece e Piracaíba. O que houve na verdade foi trabalho rotineiro executado pelos servidores. Acontece que, devido a distância e a dificuldade de transporte, elencou-se um número elevado de agentes para terminar essas localidades em menos tempo e fazer única viagem. Somente a titulo de informação:

1 – Visita do agente de endemias é rotina de serviço.

2 – Fumacê leve (costal) ou pesado (caminhão) é trabalho de rotina, desde que no caso do costal, exista pessoa suspeita de dengue no quarteirão e do pesado em caso de surto ou epidemia, mas não sai da rotina, apesar de não ser usado diariamente.

Mutirão se caracteriza por ações que fogem à rotina e envolvam todos os seguimentos da sociedade, com a finalidade de conscientizar a população.

Espero ter esclarecido o companheiro Marcos dono do blog e o leitor, principalmente acerca de ações em que nosso município deixa a desejar. Como já disse antes, Araguari não possui políticas públicas a médio e longo prazo. Vivemos de paliativo. Somem ainda a esses problemas aglutinados aqui por mim o descaso com o servidor, a desvalorização do trabalho de campo, a falta de respeito com quem exerce o trabalho. Adicione a inércia de nossos administradores. Deixo a pergunta....Onde isso vai parar?

Wellington Colenghi
Servidor Municipal perseguido pelo “novo modelo”

Pitaco do blog
Nós, leitores, é que agradecemos a sua colaboração, Colenghi. A sua participação e a de outros servidores da área de combate as endemias vêm nos ajudando a entender o que acontece em Araguari. É por meio desses esclarecimentos que podemos cobrar uma mudança de postura por parte dos gestores da Saúde Pública em Araguari.
Este texto deveria ser leitura obrigatório para os gestores do municipio. Ao que tudo indica, eles ainda têm muito o que aprender. Eficiência, continuidade do serviço público e  respeito aos subordinados e administrados são expressões desconhecidas do novo modelo de administração.

5 comentários:

Aristeu disse...

Grande Colenghi, que aula! Simples e direta. Sabei que os grandes serão sempre perseguidos e invejados.

Unknown disse...

Curiosamente, ontem um irmão me enviou, por email, um texto sobre o quanto a inteligência incomoda...

Unknown disse...

Caro Colenghi, o difícil é saber que tudo o que aconteceu com vocês não tem nada a ver com o trabalho, são questões de perseguições, apenas por vocês lutarem por melhorias no trabalho e também para a categoria, além de tudo foram perseguições pessoais e políticas,
se estivessem pensando no trabalho eu não questionaria, porém este não foi o caso, quem está trabalhando no dia a dia pode perceber esta realidade que para o trabalho não foi bom.

Unknown disse...

Edilvo realmente a inteligencia incomoda pessoas incapazes de serem autonomos de suas vidas, e infelizmente ser uma pessoa politizada machuca bastante as vezes me pergunto se não seria melhor ser alienada, pois pessoas acomodadas vivem mais tranquilas e sem risco de sofrer ataque do coração.

Wellington disse...

Companheira Antônia
Realmente quem está dentro sabe que foi perseguição. Principalmente depois daquela reunião no Ginásio Poliesportivo, onde um dos peixes grandes disse: "Colenghi, Você, O Jùlio e o Claudimir, são formadores de opinião. Precisamos eleger o Juberson(O Prometheus) para melhorar pra vocês..."Bem nunca fui eleitor do Juberson e menos agora votaria nele.
Contudo não me considero formador de opinião, apenas incentivo os companheiros a brigarem pelo que é certo. Considerar-me formador de opinião é menosprezar o conhecimento alheio.
Sei que o serviço não está funcionando, mas acho que meu tempo já passou, vou resolver as pedencias judicialmente. Ontem já tive uma inicial e tentar passar noutro concurso, assim não me aborrecerei mais.
Fiquei sabendo que estão fazendo algumas coisinhas erradas, coisas que em nossa época não podia, mas agora para terminar tratamento rápido, estão "liberando".

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